segunda-feira, 13 de outubro de 2008

o frio passava pelas frestas da janela de madeira. alcançava a de vidro e entrava no quarto. os pêlos da nuca eriçavam-se junto com o vento. essa era a tardinha chegando.

 

o resto de sol que ainda fazia alcançava as janelas de madeira. elas soltavam aquele cheiro que ainda me lembro. aquele cheiro de saudade.

 

era só mais um quarto de hotel. normal, normal. a vista era para o centro de tudo aquilo. uma igreja amarela e uma praça. milhares de pessoas passavam por ali. vez por outra até uma espécie de bonde passava por ali.

"Os joelhos de Sophie estão sangrando da queda, e acho que ela espetou o pé em algum lugar, mas é assim que tem que ser. Os últimos 100 metros quase a matam. Vejo a dor estampada no seu rosto contorcido. Os pés descalços sangram ao passarem pela grama rasteira. Ela quase sorri de dor- quase sorri da própria natureza disso tudo. Ela está fora de si.
Descalça.
Mais viva do que qualquer pessoa que eu já tenha testemunhado."

Eu sou o mensageiro - Markus Zusak

domingo, 12 de outubro de 2008

spark.

abri a gaveta. não procurava nada em especial, mas talvez ali encontrasse algo interessante. postais, cartas, fotos.. e, então, ele.

 

não fugia da normalidade. preto, com um detalhe em dourado e só. dele, agora, só saiam faíscas. o fogo já se extinguira. poderia ser só mais um isqueiro esquecido em mais uma gaveta, mas não, não era.

 

com ele em minhas mãos, lembrei de toda aquela história. de todo o fim. de todo o começo.

 

o ultimo beijo. chorávamos. ela, bêbada como sempre, falava bobagens e provocações como se a minha decisão fosse mudar. tentava absorver ali tudo de bom que ela tinha, mas já não encontrava nada. procurava a menina que eu havia conhecido. mais uma vez não encontrei nada.

 

lembro de quando comprei o isqueiro. passava por uma banca qualquer nas proximidades do colégio, quando avistei aquele objeto. com o sol, o dourado brilhava. lembrei dela imediatamente.

(hoje já não sei se lembrei dela por conta do brilho ou do objeto em si)

 

pensei em como seria um charme quando ela quisesse acender os seus habituais cigarros. eu sacaria o isqueiro e iria acende-los, como num filme. e, assim foi por muito tempo.

 

foi depois do último beijo. minha cabeça estava prestes a explodir. tomar decisões avassaladoras nunca fora algo bom pra minha sanidade. revistei meus bolsos e, enfim, encontrei o que eu procurava, mas que torcia pra não encontrar. os cigarros dela. coloquei um na boca, como nunca havia feito antes, saquei o isqueiro e tentei acende-lo. uma, duas vezes, três. dali, fogo nunca mais saiu.


coloquei o isqueiro na gaveta mais uma vez. já fazia tanto tempo que ele havia apagado. não acenderia mais.

estava lá. como mais uma memória.

domingo, 5 de outubro de 2008

plural.

cabisbaixo, andava pela rua. olhava a ponta suja do próprio tênis, estudava as linhas vermelhas que a rodeavam e os cadarços que já não eram mais brancos. não era muito de pensar, não enquanto andava. esvaziava a mente, abstraía-se do mundo.

 

mesmo olhando o chão ainda conseguia tropeçar na calçada irregular. por vezes perdia o equilíbrio, a bolsa em suas costas encontrava-se cheia de livros. voltava da escola.

 

entediado com idéia de que ainda estava no meio do caminho, começou a olhar as vitrines das lojas que passava pela frente. sempre gostou de olha-las, mas já não era tão divertido olhar as mesmas vitrines todo dia.

 

já olhava a vitrine da terceira loja do quarteirão, foi quando notou dentro da loja uma coisa realmente estranha. confuso, ele parou para averiguar melhor a situação.

 

não, o vidro não era espelhado. ele, realmente, estava lá dentro. era o rosto dele, o corpo dele, o cabelos dele. os olhos. até os sinais e as sobrancelhas eram as mesmas.

 

o medo e a curiosidade misturaram-se num impulso incontrolável. ele entrou na loja. escondeu-se e ficou observando aquele "eu" dele que, como qualquer pessoa normal, ele pensou que não existia.

 

o outro ele sorria, conversava, era galanteador com as vendedoras. mostrava-se e não temia isso. já ele, o nosso ele, sempre fora travado. tinha tudo pra ser o melhor, mas não passava de um fracasso ambulante.

 

usando da pouca razão que ainda lhe restava concluiu que aquele cara poderia ser um gêmeo perdido, tal qual essas historia bizarras que aparecem nos programas de tv aos domingos. escondeu-se perto de onde o "eu" dele estava, esperou. mais cedo ou mais tarde alguém falaria o nome dele e toda aquela piração seria resolvida.

 

depois de algum tempo esperando, acabou distraindo-se com seus pensamentos insanos. quando do nada alguém o chama, a voz vinha de perto da porta. sem pensar adiantou-se e foi até a voz.

 

sentiu uma movimentação atrás de seu corpo. olhou em direção ao movimento e se viu.

 

o outro "eu" dele também fora atender ao chamado.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

-.-"

não costumo muito ir a bibliotecas. não preciso e também não gosto delas. não preciso pois sempre que quero um livro eu compro, não agüento que ele não seja meu e só. não gosto devido do clima presente em todas elas. aquele silencio bizarro.


eu sou do barulho. de cantar, gritar, esculhambar, rir alto. sem vergonha, sem frescura. sou quase espalhafatosa. numa biblioteca, onde o silencio é lei, me sinto um peixe fora d'água, num lugar onde eu não pertenço e que não me pertence.


está certo que eu poderia ser aqueles malas que mesmo barulhentos e loucos vão para bibliotecas atazanar o juízo alheio. poderia, de fato, mas não. não consigo.


apesar da banca de rebelde transgressora eu adoro regras. e acho muito difícil conseguir quebrá-las. acho errado, infantil.  ao virar uma página na biblioteca, e ouvir o barulho que ela faz, congelo. olho pros lados e verifico se não incomodei ninguém, se a mulher do balcão vai brigar ou não.


eu nem tenho medo da hora que descobrirem a quebra das regras ou algo assim, mas minha consciência é uma filha da puta, sabe?! eu vou ta sempre pensando que eu tou desrespeitando outra pessoa e acabo lembrando daquele clichezão de "não faça aos outros o que não quer que façam contigo". nha. anyway...

 

tou cansada.